Famílias são impedidas de retornar a casa

 Após quase três anos de terem sido despejados judicialmente de suas casas, até agora não foi cumprido o mandato judicial para as famílias do Seringal Belmont voltarem a sua antiga posse. (Decisão do dia 06 de outubro de 2023, Processo N.º 7043042-90.2020.8.22.0001). O oficial de justiça e a Polícia Militar do 1º BPM não cumpriram a ordem da então Magistrada da 8ª Vara Cível de Porto Velho, Úrsula Gonçalves Theodoro de Faria Souza, que decidiu pelo retorno das famílias, alegando:

“Desta forma, diante da vulnerabilidade socioeconômica dos requeridos e a demonstração de que os requeridos já se encontravam na posse de área individualizada, dentro do imóvel a mais de ano e dia, somada à questão da liminar já ter sido suspensa anteriormente, a solução menos gravosa nesse momento é a revogação da liminar de manutenção na posse e o retorno dos requeridos para a área anteriormente ocupada por cada um deles, até o julgamento desta ação.”

Ainda, decidiu que:

“O Requerente deverá franquear para que os requeridos retornem para as suas áreas de origem, evitando qualquer ato de violência”

“7 - Distribua-se  o mandato de forma URGENTE para o plantonista.”

Após dias da Polícia Militar postergar o cumprimento imediato do mandato, no dia marcado por eles junto com o oficial de justiça, em 19/10/23, informou que apenas iriam fazer o informe da situação da área.

Poucos dias depois (23/10/23) o Oficial de Justiça designado, Pedro Paulo Soares, devolveu o mandato certificando, pelas dificuldades dadas pela parte Requerente ao cumprimento da decisão judicial:

“Pelo exposto, em que pesem as diligências, considerando o encerramento do prazo do mandado, a pendência de conclusão do estudo da Polícia Militar e, notadamente, de um acesso viável às famílias requeridas, NÃO FOI POSSÍVEL REALIZAR O RETORNO DOS REQUERIDOS À ÁREA.”

O principal motivo alegado foi terem achado as porteiras fechadas dos lugares de acesso habitual das famílias, que rodeavam um pasto vizinho. A mesma, não somente trancou a porteira do local, como abriu há tempo umas valas na estrada que a própria Secretaria Municipal de Agricultura havia aberto para escoar a produção dos pequenos agricultores, agora convertidos em sem terra.

 

Porteira da estrada dos posseiros fechada pela família Vieira.

Os acampados continuam acreditando que a Polícia Militar tem uma atitude totalmente parcial em desfavor dos seus direitos de posse, reconhecidos judicialmente. Quando no dia anterior ao marcado para o retorno pela Polícia Militar, no dia 18/10, eles foram lá tampar as imensas valas abertas para lhes impedir o retorno, mais de dez viaturas do 1o BPM de Porto Velho se fizeram imediatamente presentes, sem precisar planejamento, com baculejo e qualificação de todos os presentes, que não tinham forçado nenhuma entrada.

O pneu de um carro que carregava as enxadas e pás teve o pneu furado, testemunhas fizeram depoimento contra um dos membros da família que impediu a passagem.

Estes mesmos, por onde existe a servidão da estrada que sempre usaram os posseiros, diante das forças deslocadas da Polícia Militar, fecharam a porteira da estrada e no outro dia foram novamente um trator para abrir valas no meio da estrada e ainda entraram com um pedido de interdito proibitório na 9ª Vara Cível (diferente da que atende o processo) dificultando o retorno das famílias.

 Pneu da camionete dos posseiros foi furado .

No dia marcado com o Oficial de Justiça (19/10/23), a Polícia Militar informou que não iria mais acompanhar o retorno das famílias, e apenas realizar um estudo de situação da área. Nem isto foi realizado, pois todas as porteiras estavam fechadas. Nem o oficial de justiça nem o Capitão da PM usaram de sua autoridade para exigir o cumprimento da decisão judicial.

Dois caminhos de acesso a área, um deles pelo Ramal Vilela, estavam com porteiras fechadas. Um terceiro caminho mais longo, que cruza a sede da Requerente, pela comunidade conhecida por Terra Santa, na estrada do penal, sequer foi intentado pelo tribunal de justiça e a Polícia Militar, que exigia ir apenas “pelo caminho mais curto”.


Caminho pela área dos requerentes, imagem da Ouvidoria da DPE.

Tanto a Ouvidoria da Defensoria Pública como o Oficial de Justiça relataram estes impedimentos. Assim mais uma vez vemos que pese, ao empenho de uma magistrada, que teve a coragem de retificar a própria decisão de reintegração de inícios de 2020, uma Decisão de cumprimento imediato, está sendo postergado em um verdadeiro acirramento judicial, onde os mais prejudicados são as famílias que ficaram sem casa, sem ter como produzir, comer e vender suas produção, vivendo numa situação deplorável e com extrema dependência e inseguridade.

A Defensoria Pública, através do Defensor Leonardo Wernek de Carvalho, após receber a comunicação do Oficial que não foi possível cumpri o mandato, reiterou o pedido de cumprimento da liminar judicial,  qualificando ação de “flagrante afronta a decisão judicial” pelas dificuldades colocadas pelos Requerentes:

“Os estratagemas incluíram informações enganosas sobre a propriedade, o impedimento/bloqueio das vias de acesso e até a escavação de valas  afim de dificultar a ação da Justiça.”

Também o Parque Natural de Porto Velho permanece fechado, apesar das famílias estarem acampadas fora do mesmo, e a ordem de saída do local, pedida pela Prefeitura, também segue sem cumprimento. Ainda, a ordem de serem cadastradas pela Prefeitura para o Cadastro Único, também não foi cumprida.

Enquanto o INCRA, que cancelou os georreferenciamentos da empresa requerente, deve se pronunciar sobre a área, que tudo indica ser uma área pública, onde permanece então a ocupação da melhor posse, no caso, as famílias que agora precisam retornar a suas áreas.

Atualmente 26 famílias dos posseiros permanecem acampadas frente ao Parque Natura, resistindo e insistindo para retornar ao local onde estavam suas antigas casas, que foram queimadas ou derrubadas e enterradas baixo o chão.

Assim como as roças, algumas das quais teimam em rebrotar, apesar dos pastos e do gado e cavalos que estão sendo criados pela Requerente no local, desobedecendo também as ordens judiciais. Ainda, um dos advogados da mesma é acusado de ter construído uma casa no local grilado da terra pública e tomado aos legítimos posseiros.

Muito sofrimento e muita injustiça de consideração humana para estas famílias. Após uma reintegração em plena pandemia, deixando estas famílias totalmente vulneráveis à COVID. E do trauma de um ataque noturno por jagunços armados, que queimaram o casarão onde tinham acampado, depois que a reintegração já tinha sido suspensa. Todo o tempo expostos no acampamento a sol e chuva, com alagamento das áreas onde estiveram acampados.

Por segunda vez as famílias estavam com a mudança pronta para o retorno.

E as três expulsões abusivas da Polícia Militar, a mesma polícia que parece incapaz de aceitar a quem correspondem as decisões judiciais e de fazer a sua missão: O cumprimento da Lei.

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